Em "Night Walks", Parcels não só regressam com um novo álbum, como revelam uma faceta mais introspectiva e cinematográfica da sua sonoridade. Se o trabalho anterior da banda já nos mostrava a sua destreza em fundir funk, disco e pop de uma maneira sofisticada, neste novo capítulo, os australianos aprofundam-se num território onde a melancolia e a celebração se misturam, criando uma experiência musical de rara complexidade emocional.

    Desde o início, "Night Walks" sente-se como um passeio através de uma noite sem fim, onde o passado e o futuro se entrelaçam e as fronteiras entre o real e o imaginário desaparecem. A primeira musica, "The Road", é o ponto de partida perfeito para essa jornada: começa suave, com uma melodia contemplativa e uma produção limpa, quase etérea, mas rapidamente ganha uma intensidade suave, que nos vai conduzindo para a imersão no álbum. É uma viagem, e como qualquer boa viagem, começa lentamente, mas à medida que as musicas vão passando, a banda leva-nos para diferentes paisagens sonoras, explorando sons que vão desde o funk de grooves envolventes até as vibrações mais introspectivas da electrónica. O equilíbrio entre a euforia e a introspecção é uma das maiores forças do novo álbum. 

    Enquanto o som da banda continua a ser dançante e sedutor, há uma nuance de vulnerabilidade nas letras e na produção que traz um toque mais humano e introspectivo. "Talk To Me", por exemplo, carrega uma carga emocional que se desvia do usual otimismo das canções anteriores da banda. Aqui, as letras são mais delicadas, quase fragilizadas, como se a banda estivesse a convidar o ouvinte a entrar num momento de diálogo íntimo, onde as palavras são tão importantes quanto as melodias (na verdade para mim é sempre assim).

    Ao longo do álbum, continuam a explorar o seu gosto pela estética retro, mas de forma mais refinada, mais madura. A sonoridade disco e funk, tão presente nos seus trabalhos anteriores, cede agora lugar a um som mais experimental, que mistura camadas de sintetizadores brilhantes com guitarras suaves e percussões subtis, criando uma experiência musical que é ao mesmo tempo familiar e nova. É como se a banda tivesse encontrado uma nova linguagem para expressar as emoções que exploram nas suas letras: uma mistura de nostalgia com o poder de se reinventar.

    A produção de "Night Walks" é refinada e luxuosa, uma obra-prima que sublinha o talento de Parcels para criar atmosferas que transportam o ouvinte para diferentes estados de espírito. Cada faixa é meticulosamente construída, com detalhes subtis que vão se revelando a cada audição. A utilização de espaços sonoros (momentos de silêncio, de sons ligeiramente distantes) confere ao álbum uma sensação de profundidade, como se estivéssemos a caminhar por um ambiente noturno onde cada passo ressoasse com uma força delicada.

    No final, "Night Walks" é mais do que apenas um álbum. É uma noite inteira condensada em música: uma noite de reflexão, de celebração e de uma beleza efémera que se perde nas estrelas. Parcels não estão apenas a construir canções; estão a criar momentos, experiências sonoras que nos fazem sentir e pensar sobre o que nos move, o que nos emociona e o que nos liga uns aos outros. O novo álbum é uma prova do quanto a banda evoluiu, mantendo a sua capacidade de nos fazer dançar, mas agora com um toque de introspecção que torna a experiência ainda mais profunda.

    Felizmente Parcels são uma das bandas do cartaz do Primavera Sound Porto, e quando subirem ao palco a noite vai ganhar uma nova dimensão. O novo álbum é uma declaração de intenções: mais introspectivo, mais cinematográfico, mais imersivo. Ao vivo, essa aura quase onírica vai se materializar em batidas pulsantes e sintetizadores etéreos, como se cada canção fosse uma paisagem sonora que se desenrola à medida que o público se perde na vibração do momento.