Escárnio, Gatafunho e Cortada: A arte do ruído e da rebeldia na ZDB
Galeria Zé dos Bois, em Lisboa, foi o cenário ideal para uma noite de sons intensos e propostas audaciosas. O punk reinventado por três bandas que deixam claro que o ruído é, mais do que nunca, um campo fértil para a resistência e a expressão. Uma noite inesquecível de experimentação sonora. Escárnio, Gatafunho e Cortada trouxeram consigo uma nova definição do que é o punk hoje, mais imprevisível, mais polido nas margens do ruído e, acima de tudo, com um compromisso forte com o que é subversivo, urgente e radical.
Escárnio: O Novo Grito Feminista
Escárnio, banda liderada por Violeta Luz, estreou-se ao vivo com o EP Falha-me Deus, num set que, embora relativamente curto, fez questão de estabelecer uma presença sonora e política imediata. A proposta da banda é um punk cru que, em termos sonoros, soa à velha guarda, mas com uma dimensão extra: a vocalização de Violeta não se limita a ser apenas uma emissão, mas um grito de afirmação feminista. As guitarras são secas e a bateria, sem grandes adornos, mantém a dinâmica simples, mas eficaz, focada na intensidade. O desempenho ao vivo foi marcado pela garra e pela entrega da vocalista, que soube tirar partido da sua posição no palco, mesmo que ainda com algum espaço para explorar a teatralidade do momento. O uso das letras, diretas e intensas, revelou um caráter reivindicativo, que transporta para o público a urgência da voz feminina no contexto do punk atual.
Gatafunho: A Irreverência do Caos Organizado
Cortada: Noise-Punk de Precisão Cirúrgica
A fechar a noite, Cortada apresentou Gānbēi, o seu novo álbum, que foi traduzido ao vivo com a precisão e intensidade de uma descarga elétrica. Levaram ao palco a sua proposta noise-punk com uma agressividade que, em termos técnicos, não deixou margem para dúvida: o som de Cortada é pesado, abrasivo e imperturbável. A bateria é constante e agressiva, o baixo mantém-se denso e tenso, enquanto a guitarra corta o espaço com distorções que rasgam. O vocal, em overdrive, perde clareza em favor da expressão visceral e não há espaço para nuances — o objetivo é a saturação sensorial. Ao contrário de outros projetos do género, a performance de Cortada não se perde no caos; ao invés disso, revela uma construção tensa, onde cada parte da canção serve o todo. A atenção aos detalhes na produção ao vivo foi um ponto alto, mantendo a brutalidade sem sacrificar a definição do som.
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